Ao longo da vida, acumulou trocentos cadernos de anotações. Afinal, sempre teve memória fraca. Assim, quando tem uma boa ideia ou vê algo interessante corre pra anotar, pra não esquecer. Certo dia, encontrou nas bagunças um caderno antigo. Várias ideias esquecidas que não aproveitou. Se depara com uma muito boa. Muito boa mesmo. Como teve essa ideia? Não lembra. Por que não aproveitou? É sensacional! Imediatamente desenvolve. Publica. Torna-se seu melhor livro. Melhor história. Genial! Sucesso! Não acredita que teve ideia tão incrível.
Tempos depois, arrumando uma velha estante, chama sua atenção um livro velho, esquecido debaixo de vários outros. De um autor desconhecido. Havia comprado em um sebo. Leu já há muito tempo. Não lembra quase nada. De curiosidade o relê. Algumas páginas depois, a agonia. Não. Não! A sua ideia. A sua grande ideia. O seu maior sucesso. Está ali. Naquele livro. Tinha lido, e por ter achado interessante, escrevera um breve resumo, mas esquecera de anotar a referência. Quando viu a anotação no caderno, anos depois, pensou que era uma ideia original sua. Mas não era. Não era! Sua memória lhe pregou uma peça. E agora? O que fazer? Tornar público que sua grande obra é um plágio de um livro desconhecido? Mas foi um plágio involuntário, não foi de propósito, não teve culpa. E quem vai acreditar nisso? Pode alegar que foi coincidência, afinal esse autor é totalmente desconhecido. Mas plágio é plágio. Como vai conviver com a culpa de ter roubado aquela ideia, ainda que sem querer? Nunca mais irá conseguir criar nada. Como saber que sua imaginação não estará te enganando novamente? Como saber se a frase escrita é de fato sua, ou que leu ou ouviu em algum lugar e esqueceu?
Bem, o processo de criação não é isso? Um eterno copiar, recopiar, reviver, com leves distorções? Convence a si que deve continuar criando. Mesmo que seja enganação.
Jamais voltou a publicar nada. Que sua obra restante fique perdida, como aquele livro desconhecido, até que alguém a encontre, talvez. E que o julgamento venha de cada leitura.
Nenhum comentário:
Postar um comentário