AGORA TAMBEM TEXTOS SEM ACENTUACAO E SEM PONTUACAO

SOU O QUE SEREI

domingo, 28 de março de 2021

Evolução



Tentou revolucionar o mundo


Falhou miseravelmente


Percebeu então que deveria ser mais humilde


Revolucionar a cidade


Não conseguiu


Revolucionar o bairro


Não deu


Revolucionar a rua


Não foi


Revolucionar sua casa


Também não


Conclui o óbvio 


Deveria revolucionar a si.


sábado, 27 de março de 2021

Viagens


Numa das nossas viagens transcendentais


Pousamos em um deserto


Apenas dunas e areia


E nosso corpo astral


Felizmente nesta forma sol não fustiga


Podemos caminhar despreocupadamente


Por horas


Nada muda


Será que nós mudamos?


Olhe pra trás e perceba suas pegadas na areia


Seres etéreos não deveriam deixar pegadas


Se você transformou o deserto, então o deserto te transformou, diria Borges


Olhe mais intensamente pra areia e


Ela não está mais lá


Apenas o piso do seu quarto


Estamos de volta


Não estamos de volta


Sempre estivemos aqui


Não fomos ao deserto 


O deserto veio a nós



Horas e horas passam


Talvez dias, talvez anos 


Nada muda 


Nada acontece


Voltamos ao deserto


Sol a pino, escaldante


Muita sede, sem água


Seguimos, um calor inclemente


Chegamos a lugar nenhum


O deserto devastador não tem fim


Está bem, maldito, você venceu


Deitamos na areia


É sua vez, deserto, nos transforme.


sábado, 20 de março de 2021

Mina

 

Mina

Fenilisopropila mina

Anfetamínica

Mina

Anfeta mina

Estimulante físico-intelectual

Contra fadiga

Viciante

Excitante

E a tolerância? Doses cada vez maiores para produzir o mesmo efeito...


sexta-feira, 19 de março de 2021

Mimimi

 Ué

Ele não era atleta?

Como pode ter morrido?

O presidente garantiu que quem fosse atleta não sofreria nada.

Essa morte deve ser invenção dos comunistas...


terça-feira, 16 de março de 2021

uma vida bem vivida


uma vida bem vivida


Morreu, sem dor, em paz, feliz, com conforto e serenidade espiritual, e sensação de realização,

Aos cinco meses de idade.


segunda-feira, 15 de março de 2021

Segunda visão

 Segunda visão


"Quando fecho os olhos, vejo coisas horríveis." Caso deveras interessante e complexo, o do Sr Josenias Galhofo. Totalmente lúcido e inteligente, sem indícios alucinógenos ou paranóicos. Isso no dia a dia, quando está de olhos abertos. Quando os fecha, em qualquer ocasião, começa a ter visões macabras. Essas visões não se dão durante o sono, seus sonhos são absolutamente normais e até suaves. Mas quando está desperto, em qualquer momento, se fechar os olhos… "É como se um terceiro olho se abrisse. Parece tão real que preciso abrir os olhos naturais para me certificar de que não é a realidade." E o que você vê? "O horror. O mais absoluto horror. Cenas tão pavorosas que não consigo ficar de olhos fechados por mais que alguns segundos." Precisamos entender e superar. Feche os olhos. Não importa o que veja, mantenha-os fechados. O que vê? "Santo Deus. É insano. É doente. Duas criaturas que… que…" Nunca mais voltou a abrir os olhos. Que o além seja um cenário mais piedoso.


domingo, 14 de março de 2021

Hora da ceia

 Hora da ceia


Muitas baratas por aqui. Gosto delas. São como eu. Criaturas da noite. Criaturas podres, que vivem em qualquer lugar, quanto mais imundo melhor. Deixo uma delas subir em minha mão. Começa a mordiscar meu dedo. É curioso como quase não sinto sugar meu sangue. Ela caminha até uma pequena ferida no meu dedo, um arranhão quando resvalei de mau jeito numa porta enferrujada. Sensação gostosa das mordiscadelas. É mais uma coceira que uma dor. Fico o mais imóvel possível por longos e saborosos segundos. Por quanto tempo ela irá se deleitar?

Num movimento rápido a pego com a outra mão. Seguro de forma delicada, para não esmagar a coitada. Ela movimenta as perninhas numa tentativa mecânica de escapar. É um bicho tão fofo e engraçadinho. Bonitinho e gostoso. Muito gostoso. Bem, amiguinha, você teve seu banquete. Agora é minha vez. Sutilmente a encosto em meus lábios. Primeiro, passo a língua sobre sua tenra cabecinha e sua carapaça, para sentir seu doce sabor. Delícia. Com a língua a empurro para dentro. Deixo-a se debater um pouco, chupo gostoso, como se fosse uma bala, sinto suas anteninhas roçarem em meu palato. Até que finalmente cravo vagarosamente meus dentes sobre ela, sinto seu doce e gosmento sangue escorrer por minha boca e minha garganta. Mastigo lentamente, mas a degustação acaba rápido demais, o inseto se esbaldou mais tempo comigo. Fica o gosto de quero mais. Procuro outros espécimes pelo chão, mas pela janela da cabine vejo o Josevâncio se aproximando. O Josevâncio é um dos moradores do prédio em que trabalho como porteiro noturno. Ele trabalha em um restaurante, sempre chega tarde. Sempre quando chega me pergunta qual a bizarrice do dia. É que mora muita gente excêntrica nesse prédio e frequentemente acontecem alguns tumultos, ou fatos inusitados. Como na semana passada, em que o Invertildo, do 403, correu pelado em volta do quarteirão pra pagar uma promessa. "Boa noite, Mazóglio. A turma aí aprontou hoje?" Na pequena TV da minha guarita, créditos passando, algum filme acabando. "Não, não", respondo, "tá bem tranquilo, tudo normal".